X-Men ’97: a nostalgia que se reinventa com propósito.

Revisitar o passado é uma das tarefas mais árduas que existem. Afinal, muitas emoções estão envolvidas, dentre elas, a nostalgia. Dificilmente revivemos com a mesma intensidade os sentimentos que experimentamos quando éramos crianças ou jovens. O mesmo se dá com as obras audiovisuais. Algumas permanecem incólumes frente à ação do tempo, outras sofrem dolorosos tombos. Se você, caro leitor, nutre amores e carinho por uma obra “duvidosa” de sua infância ou juventude… tente deixá-la por lá mesmo rsrs.

Contudo, existem trabalhos que, retiradas as limitações da época e/ou de seus orçamentos, ainda preservam os valores e os impactos de seus lançamentos. X-Men: The Animated Series (1992–1997) encontra-se nesse seleto grupo. Esta série cumpriu bem a missão de trazer à tona as discussões filosóficas, raciais e sociais apresentadas pelos quadrinhos desde a década de 60 por meio dos criadores dos X-Men, os saudosos Stan Lee e Jack Kirby. Milhões de espectadores puderam moldar seus pensamentos ou foram consideravelmente influenciados por estas abordagens. Eu fui um deles e sinto-me na obrigação de ressaltar a seguinte visão: apreciar ou estar ao lado dos X-Men é ser contra toda e qualquer forma de discriminação e injustiça.
Quando a Marvel e o Disney+ anunciaram uma continuação direta dessa icônica animação, muitos fãs ficaram divididos, pois inúmeros revivals acabaram por manchar o legado de seus precursores — isso quando não nos entregaram uma enxurrada de fan services para que não nos atentássemos às falhas ou à falta de um enredo competente. Mas X-Men ’97 provou ser mais do que uma viagem nostálgica: foi uma reinterpretação ousada, emocional e incrivelmente atual do universo mutante.
Cabe ressaltar que o design gráfico rende homenagens aos traços da série original; porém, sua fluidez foi aumentada e detalhes modernos foram acrescentados, proporcionando, por sua vez, momentos de ação que encantam os olhos. A dinâmica do grupo quando está combatendo deveria servir de exemplo para qualquer adaptação em live action futura. E a magistral abertura? Ela se faz presente… sofrendo uma repaginação sem perder a fidelidade.
O formato episódico procura manter a atmosfera oferecida pelos anos 90. Deve-se valorizar o enredo em sua quase totalidade. A narrativa contempla temas pesados (que existiam outrora), mas que aqui dialogam ainda mais com a realidade em que vivemos. Intolerância, genocídio, luto, discriminação, manipulação midiática e terrorismo estão presentes e são trabalhados de forma madura. Essas feridas estão abertas na nossa dimensão, e outras tantas brotam a cada instante… seja no outro lado do planeta, ao nosso lado ou, infelizmente, de nós mesmos. Por isso devemos estar sempre alertas. Uma sociedade sadia, acolhedora e justa precisa ter como ponto de partida o aprimoramento constante de nós mesmos.
Dando continuidade ao raciocínio sobre o enredo, responda-me: não foi bacana ver um Ciclope que realmente fosse poderoso e um líder? Ou mais do que isso, duvidando de sua própria capacidade, entretanto, ainda desejando se encaixar no molde que construíram para ele e que, não sejamos tolos, ele almejou? Esse é o Ciclope que queremos, Marvel!

Mencionei ou dei a entender que nem tudo são flores em termos de enredo — muito por conta dos anos 90. Lá estão depositadas as mais obscuras, inusitadas, surreais e inverossímeis histórias em quadrinhos. Inverossímeis talvez seja injustiça. Tendo um bom roteiro e um tempo razoável de tela… tudo é possível. Mas o arco da Madelyne Pryor provou ser muito apressado e de fácil aceitação. Difícil defender o tema clonagem quando ele assume tons novelescos. Todavia, os arcos que envolvem Magneto, Gambit, Vampira e Tempestade merecem destaque.
Bem, sei que os leitores do Super Tribo são distintos. Creio que, diante de uma atrocidade ou de um ato de covardia cometido contra os seus semelhantes… vocês não se manteriam impassíveis. E esse, meu caro e minha cara, é o poder da cultura. Apresenta-se como algo que (seja qual for a fonte) esclarece, conclama e nos direciona. Sendo assim, o que você fará quando ouvir:
“Venham a mim, meus X-Men!”?